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Samba na terra do frevo: a persistência do ritmo no Carnaval pernambucano

Foto do escritor: Manguetown RevistaManguetown Revista

Nesta reportagem especial de Carnaval, a Manguetown Revista traz um apanhado sobre o papel e relevância cultural do samba para Pernambuco.

Desfile de samba 2025
Foto: Uenni/PCR

Embora o frevo seja amplamente reconhecido como parte do Carnaval do Recife, o samba também tem uma história profundamente enraizada na cultura pernambucana. Apesar de sua importância histórica e cultural, no entanto, ao longo do tempo, o ritmo foi silenciado e subjugado como um rival do frevo. 


O samba se firmou como um ritmo presente dentro das comunidades, formado por populares e trabalhadores, em sua grande maioria, pessoas negras, tornando-se símbolo de resistência e luta. O gênero musical ganhou vida nas ruas, principalmente em zonas periféricas das cidades, e no Recife não foi diferente. Na capital pernambucana as escolas de samba já foram numerosas e viveram o  auge entre os anos 1960 e 1990, arrastando multidões de pessoas às passarelas para ver o desfilar e brilho das agremiações.


Nesta reportagem especial de Carnaval, a Manguetown Revista traz um apanhado sobre o papel e relevância cultural do samba para Pernambuco.


Frevo versus Samba


Desfile de samba 2025
Foto: Uenni/PCR

Em Pernambuco ocorreu durante os anos de 1950 a 1970 um conflito em relação ao samba dentro do Carnaval do Recife. O ritmo era considerado por muitos como uma influência externa, um “intruso” carioca, estrangeiro na terra do frevo. 


Um nome muito marcante a se pensar sobre a disputa entre frevo e samba é o famoso e influente jornalista e sociólogo pernambucano, Gilberto Freyre. Ele escreveu diversos textos, como o manifesto “Recifense sim, sub-carioca não!” (1966), considerando o samba como um intruso no carnaval pernambucano, e os adeptos ao ritmo como traidores.


“A invasão das escolas de samba [...]. A traição ostensiva às tradições mais características de Pernambuco no que se refere a expressões carnavalescas. Um carnaval do Recife em que comecem a predominar escolas de samba ou qualquer outro exotismo dirigido, já não é um carnaval recifense ou pernambucano”, escreveu o teórico no manifesto, bem-aceito pela classe intelectual da época.


A rixa entre os sambistas e os “defensores” do Carnaval pernambucano se estendeu por anos e gerou debates entre jornalistas, intelectuais e músicos, mas o ritmo se manteve forte apesar das adversidades. Pouco a pouco, ganhou o  público recifense e encheu arquibancadas com os desfiles nas principais ruas da capital. Além das escolas de samba, também participavam outras agremiações, como troças, maracatus e caboclinhos.


Atualmente, a Região Metropolitana do Recife (RMR) conta com cerca de 20 escolas de samba, incluindo a Gigantes do Samba, Galeria do Ritmo, Limonil, Preto Velho e Imperadores da Vila São Miguel. Isso, no entanto, não se traduz em apoio para quem vive do samba na região. “Hoje a gente encontra várias casas defendendo a bandeira do samba, mas Pernambuco é o habitat do Frevo, do Maracatu. Os turistas não vêm para cá ver o samba, eles querem ver os passistas”, afirmou a cantora de samba Maria Pagodinho. 


O samba persiste


Gigantes do Samba
Foto: Paulo Paiva/DP/D.A Press

Apesar da falta de apoio financeiro e da desvalorização histórica, o samba resiste. Escolas como a Gigantes do Samba, da comunidade da Bomba do Hemetério, Zona Norte do Recife, resistem graças ao esforço de líderes comunitários e ao engajamento de suas comunidades. Os desafios, no entanto, são grandes: enquanto o frevo recebe amplo apoio da rede turística  e dos poderes públicos, o samba luta por reconhecimento e recursos. Para Maria Pagodinho, o financiamento destinado às escolas de samba, por exemplo, é insuficiente para cobrir os custos de fantasias e produção, o que dificulta a manutenção das agremiações.


“A desvalorização do samba também existe, principalmente, no poder público. São tantos outros ritmos, que tem mais valor, que eles valorizam mais. A gente não vê festivais de samba aqui, inclusive para o pessoal da terra. Não tem uma abertura muito grande. E quando tem é de ano em ano. É só no Carnaval”, destacou a cantora. 


A disputa histórica entre frevo e samba foi, aos poucos, sendo esquecida com o tempo. Em grandes reportagens e pautas jornalísticas sobre o Carnaval de Recife, o samba raramente era citado, mesmo tendo uma presença significativa na cultura local. As escolas de samba, no entanto, continuam a disputar espaço na festividade da terra do frevo, adaptando-se e resistindo como uma expressão artística e identitária que celebra a força e a resistência do povo pernambucano.


Tem samba no Recife


Não tem como pensar em samba sem lembrar do famoso Pagode do Didi, um dos principais encontros de roda de samba e pagode do Estado de Pernambuco. Fundado em 1981 por Vlademir de Souza Ferreira, mais conhecido como Didi do Pagode, o evento anima as sextas-feiras no bairro de Santo Antônio, no Centro do Recife. 


Além de ser um local de entretenimento, o espaço é também ponto de encontro de artistas do gênero musical, incluindo integrantes de escolas de samba. Reconhecido por seu valor cultural, Didi recebeu o título de Patrimônio Vivo do Estado de Pernambuco em 2010, além de Patrimônio Cultural Imaterial da cidade em outubro do ano passado. 


O samba no Carnaval de Recife vai além de um ritmo musical, se torna uma expressão de resistência, identidade e cultura que atravessa gerações. Apesar de historicamente ser rivalizado com frevo, o samba se mantém junto às escolas de samba e rodas de pagode por toda a cidade. A luta por reconhecimento e apoio continua, mas o samba se adapta, resiste e renasce, mostrando que, em Pernambuco, ele não é um estrangeiro ou intruso, mas parte da história e da alma do folião.


“Pernambuco é conhecido como a terra do Frevo e do Maracatu, mas sempre foi uma terra de pluralidade cultural, somos abertos a todas as manifestações populares. Não faz muita lógica fomentar uma briga entre o samba, frevo ou qualquer cultura onde as pessoas abraçam tudo. Nós somos artistas que participamos de escola de samba, mas também fazemos frevo e participação musical para canções, não precisa dizer que o samba é de tal lugar, ou que Frevo é de tal lugar, porque no Carnaval de Pernambuco se toca tudo”, afirmou Sérgio, ator e integrante da escola Gigantes do Samba.


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