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“Vrum vrum” e o direito de ser safada: música de Karla Gnom e Huná defende ousadia feminina para além da sensualidade

Foto do escritor: Letícia BarbosaLetícia Barbosa

Em entrevista para a Manguetown Revista, as artistas contam sobre o processo da produção musical e videoclipe



Huná e KG em videoclipe de "Vrum vrum". Foto: Jezz Maia
Huná e KG em videoclipe de "Vrum vrum". Foto: Jezz Maia

Bem a tempo do Carnaval, a  DJ pernambucana Karla Gnom, a KG, lançou  “Vrum vrum”, em parceria com a rapper alagoana Huná.  Passados os dias de folia, a música mostra que veio para ficar, com letra, videoclipe e bastidores que exaltam a potência da produção feminina. 


Com dez anos de carreira, KG é do bairro dos Coelhos, área central do Recife. Autodidata, a DJ e produtora musical costuma se aventurar quando o assunto é sonoridade, tendo destaque em estilos como Trap, Drill, Dubstep. Já a cantora Huná passeia pelo POP e Rap, além de ter uma carreira no cinema, sendo premiada como Melhor Atriz na 7ª edição do Festival Curta Caicó.


A união de Alagoas e Pernambuco resultou em um hit repleto de autenticidade e referências culturais da trajetória de cada uma das artistas.  


“Eu acredito  que nós duas somos artistas muito autênticas. Acredito também que quando você entra no perfil das redes sociais ou youtube de cada uma, você identifica muito da nossa cultura. A gente também traz muito de nós”, declara Huná.


Para Karla, esse intercâmbio geográfico enriquece a troca cultural. “Eu acho que foi importante pra galera de Maceió conhecer quem é daqui e quem é de Pernambuco, conhecer quem é de lá”.


Conexão Recife-Maceió


Após um primeiro contato por redes sociais, Karla Gnom e Huná se movimentaram para a fazer o projeto acontecer.  Os 258 km não era o único fator que as distanciava. As duas precisaram se adaptar à forma de trabalhar uma da outra. Enquanto a DJ costuma dar a luz aos beats de uma vez só, a compositora elabora suas letras de forma contínua, uma parte por vez. 


Com a base sonora pronta, em maio de 2024, KG pegava a estrada para encontrar a parceira de trabalho, e, por meio de um áudio, Huná já envia os primeiros versos do que veio a ser, em janeiro deste ano, “Vrum vrum”.  Quando ouviu a primeira proposta, a beatmaker só teve um pensamento: “caraca, boy! É isso!”


No que se refere à sonoridade, KG dispara:


Foto: Jezz Maia
Foto: Jezz Maia

“Eu me deixo levar muito pelo momento que eu estou. Às vezes, eu estou um pouco acelerada. E eu gosto de coisas aceleradas, principalmente, quando é pra botar pra cantar em cima. Eu estava numa pegada de eletrônico e o drill tem um pouco disso. Mas não definimos o que ia ser desde o início”


O “Vrum vrum” também foi ideia de Karla, o que ela conta como um fato curioso acerca do trabalho.


“E uma coisa engraçada que eu posso falar é como surgiu o nome ‘vrumvrum’.  Eu acho legal porque foi  por meio de um erro meu, tá ligado? Um dia eu estava escutando uma música [ Boom Boom Pow] do Black Eyed Peas, e em vez de ‘boom boom boom’, eu ouvia ‘vrum vrum vrum’. Quis usar isso em algum lugar. Quando Huná mandou a letra, encaixou”, revela.

As duas artistas definem a concepção do projeto com a palavra “desafio”. E o resultado é evidente tanto na conexão entre elas durante uma entrevista para lá de descontraída, quanto na música. “Eu fiquei muito feliz com o ponto que a gente chegou, deixou escancarado pra todo mundo ouvir o que a gente vive e o que a gente é, afirma Huná.


É sobre o direito de ser safada


Para além do já desgastado e comercialmente cooptado “empoderamento feminino”, “Vrum vrum”, na letra e no videoclipe, reivindica o direito de ousar e - por que não? - ser safada. 


“Eu acho que ‘Vrum vrum’ fala sobre ser safada, porque nós, mulheres, temos que ter a confiança de dizer: ‘eu não tenho vergonha de ser safada’. E safada porque é descarada, porque ela sabe o que quer, põe a cara à tapa mesmo. Fala sobre essas mulheres que não têm medo, mulheres que provam isso fazendo o bagulho acontecer. E que estão na cena se apoiando. São mulheres ousadas”, explica Huná.


O  “ser safada” não exclui, por sua vez, a sensualidade, mas com a preocupação de subverter a lógica de satisfazer o prazer masculino e a fetichização da mulher negra.  


“Nós somos sexualizadas o tempo inteiro. Quando digo que a gente é safada, não posso dizer que não é sexual. Eu sou ousada e eu estou fazendo uma coisa que talvez os homens querem que seja pelo prazer deles.  O  intuito é mostrar que as mulheres também podem”, continua a rapper. 


Sobre isso, KG traz sua própria experiência no mercado musical : “era sempre os caras fazendo tudo e as mulheres, só uma bunda”. Ela também comenta o enredo do videoclipe de “Vrum vrum”, gravado na Ilha de Itamaracá, Região Metropolitana do Recife. “Mostramos no clipe que eu estou na minha casa e ela [Huná] chega, depois de ter feito o show dela, mas a ideia é ir lá trabalhar, gravar um som, tá ligado? Da mesma forma que ela compra joias, tá fazendo o dinheiro dela, também está atenta a gravar música, trabalhar”.


 A DJ vem trabalhando contra essa estrutura desde seus projetos anteriores, como o “Fábrica de Hinos”, de 2019. De lá pra cá, procura fortalecer a presença de mulheres na frente e por trás das câmeras e dos microfones. Em “Vrum vrum” não foi diferente, a equipe envolvida foi majoritariamente feminina, contando com apenas um homem cis e um homem trans. 


Como produtora, KG encontra um cenário ainda mais desafiador. Ela destaca que, apesar de existirem mulheres muito talentosas nessa área, os nomes conhecidos e prestigiados são sempre os masculinos. “É só olhar o número de seguidores no instagram”, argumenta. O assédio é outro obstáculo. “Tem caras que vêm com papo de paquera, tá ligado? E a gente querendo algo pelo nosso talento, acontece isso”, completa.


Citando a rapper paulista Ajuliacosta quando canta "queridas, homens são lobos, não andam sozinhos", Huná defende que, apesar das velhas lutas, as artistas femininas têm se fortalecido e mostrado isso em suas músicas.  “Eu acho que estamos vivendo o momento ideal  para falar através das nossas letras, dos nossos clipes. As mulheres, principalmente do rap, estão em um momento de destaque muito grande”.




 





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