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Foto do escritorBeatriz Santana

Coco de Fulô lança primeiro EP no sábado (30), e promete transportar o Coco Rural e as sementes sonoras de Nazaré da Mata

Atualizado: 4 de dez.

O primeiro EP do grupo Coco de Fulô é fruto de um trabalho semeado há mais de cinco anos e promete transportar, para além dos limites do território, as sementes sonoras que germinam no solo fértil de Nazaré da Mata.

Imagem: Hugo Muniz

Se o Brasil é a terra do samba e Pernambuco a do frevo, chegou a hora de mostrar que Nazaré da Mata é a terra do Coco Rural. Para isso, o grupo Coco de Fulô vai compartilhar com o público, por meio do lançamento do primeiro EP, a diversidade da célula rítmica da cidade localizada na Zona da Mata Norte do Estado. Intitulado “Coco de Fulô: O Coco Rural”, o disco vai estar disponível nas plataformas digitais junto a um videoclipe no YouTube neste sábado (30).


“Cana de Santa Fé”, “O Trem”, “Canoeiro”, “Cadê Mariquinha?” e “Cana Adubada” são as cinco faixas do EP que carrega na essência a cultura rural de toda a Zona Da Mata Norte. O termo “Rural” não está no título por obra do acaso, inclusive, mas como fruto de um compromisso que vem sendo semeado pelo grupo há mais de cinco anos: reafirmar a existência dessa linguagem que é responsável por tornar a região um território tão rico.


Em uma entrevista exclusiva para a Manguetown Revista, o mestre brincante, músico e idealizador do Coco de Fulô, Ricco Serafim, compartilhou um pouco da trajetória do grupo até o lançamento do EP.


“Na brincadeira popular daquele território e daqueles engenhos, o Coco sempre esteve presente”


No anoitecer, o suor dos trabalhadores do campo não escorre pelo mesmo motivo. Em busca de diversão após um dia de labuta, o povo se reúne para cantar, dançar e suar ao som de um ritmo secular. Os cortadores de cana, que também são mestres brincantes, mantêm viva a tradição das manifestações populares. E é o grupo Coco de Fulô que vem transportando, para além dos limites do território, as sementes sonoras que permanecem germinando no solo fértil de Nazaré da Mata.


“Eu faço questão que as pessoas fiquem sabendo que aquilo que tá tocando é Coco Rural. E de onde é? Da Mata Norte de Pernambuco”, reforçou Ricco que, antes da existência do Coco de Fulô, já tinha contato com as brincadeiras populares e um contato especial com o Coco da Região Mata Norte de Pernambuco.


“Fazer do Coco de Fulô uma brincadeira, mas uma brincadeira séria”


Natural do Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana do Recife (RMR), Ricco já participava diretamente dos brinquedos populares. Foi a diversidade multicultural de Nazaré da Mata, no entanto, que alcançou o músico de maneira particular e o fez deixar outras produções em segundo plano para se dedicar totalmente ao que idealizava como Coco de Fulô. 


A brincadeira continuou, mas estava diferente. Sem perder a essência do som autêntico e da poesia natural, tão característica do Coco Rural, a brincadeira de Ricco assumiu uma seriedade. O comprometimento em inovar sem descaracterizar, em mostrar o que há de tão rico na musicalidade dos terreiros, dos engenhos de cana-de-açúcar, do Coco de Nazaré da Mata, e em refletir um território e um povo com tanta vivência, fazem parte da responsabilidade que o Coco de Fulô carrega hoje.


Ei, cuidado para o barco não se afundiar 


Repetir nas letras das músicas que o barco não vai “afundar”, mas “afundiar”, e que o doce não é do “mel”, e sim do “mé”, é o esforço para preservar a identidade das brincadeiras populares. O que aparenta ser um mínimo detalhe, na verdade, é uma tentativa de dialogar diretamente com quem ouve. 


No trecho “tenha cuidado no barco para ele não se afundiar”, do Mestre Cosme Antônio, que deixou diversas contribuições para o Coco de Fulô antes de falecer, e está presente no EP, o termo “afundiar” foi usado de propósito. Caso “afundar” tivesse sido a palavra escolhida, o sentido permaneceria o mesmo, mas o impacto da compreensão seria outro. 

“Vamos corrigir o português e os ‘essês’, massa, fica legal, os críticos vão adorar. Mas e o público?”, indagou.

Nas entrelinhas desse questionamento feito por Ricco, está o objetivo das letras do grupo Coco de Fulô: falar para o mundo em nome das pessoas da Zona da Mata Norte, das pessoas de Nazaré da Mata, mas, muito mais que isso, criar referências poéticas que, quando cantadas, poderão ser associadas por quem ouve.


O “afundiar” no lugar de “afundar”, o “mé” ao invés de “mel” é capaz de fazer indivíduos se reconhecerem em uma produção artística. O que, queira quer não, desperta sensações de pertencimento e de afirmação.


“Todo mundo sabe que é Coco de Fulô pela frequência (sonora)”


Imagem: Hugo Muniz

O trompete de Guilherme, os trombones de Josias e de João, o sax de Luciano, o bombinho de Albério, o mineiro de Ciel, o tarol de Lilo (Alison) e o vocal do mestre brincante Ricco compõem a formação orquestrada do grupo. Juntos, carregam no peito e nos arranjos o orgulho em tocar Coco Rural. 


O resultado sonoro desse orgulho deixa uma marca em quem ouve e faz ser possível guardar na memória uma melodia reconhecível de longe. Antes do lançamento do EP, a população de Nazaré da Mata e proximidades já captava, graças às apresentações ao vivo e as quenturas das festas, os áudios com trechos de músicas e espalhava o trabalho do Coco de Fulô por todo o território.


O professor de música natural de Nazaré da Mata e integrante do Coco de Fulô, Guilherme Otávio, conversou com a Manguetown Revista sobre como as vivências locais estão mescladas ao conhecimentos trazidos por Ricco nas composições do Coco de Fulô e se fazem presentes no EP.


“O coco de fulô é uma mistura do coco rural com um pouco do que Ricco trouxe da coco tradicional dele, que é do Cabo de Santo Agostinho”, iniciou Guilherme, que valoriza a dedicação do grupo em incorporar diferentes elementos e manter a vivência e a experiência local de Nazaré da Mata acesas, tanto em produções como no disco.


Guilherme foi quem fez os arranjos musicais do disco e somou as experiências musicais de Nazaré da Mata ao EP. Esse contato desde a infância do professor de música com a cultura e com o Coco Rural, junto ao objetivo de Ricco agregar conhecimentos e musicalidades sem perder a essência do tradicional, é o elo e a base que fundamentam o primeiro disco do grupo.


“O ritmo do coco rural é preservado e a célula rítmica se mantém no coco rural daqui de Nazaré da Mata, porém tem o alffaier que aqui em Nazaré não se usa”, finalizou

É só adubar a cana que coisas novas vão surgir


“Cana Adubada” é o nome da quinta faixa presente no EP, e, para entender melhor sobre esse conceito que passeia por todo o disco, a Manguetown Revista contou com as palavras do engenheiro musical e produtor musical, Buguinha Dub. Ele teve participação significativa na produção e na inovação do Coco de Fulô.


“Desconstruir para reconstruir” é o que está por trás do significado do termo “adubada”. Assim como o adubo na plantação de cana é capaz de fazê-la crescer, o adubo de Buguinha presente na mixagem e masterização do EP “Coco de Fulô: O Coco Rural” foi capaz de enriquecer mais ainda a musicalidade do grupo.


Elementos de outras culturas musicais, como da cultura do grave e do reggae dub, foram adicionadas ao EP, tornando-o original. Isso tudo, com a essência do tradicional, do Coco Rural secular da Zona da Mata Norte de Pernambuco, de Nazaré da Mata, mantida. 

Ricco Serafim e Buguinha Dub em entrevista exclusiva para a Manguetown Revista. Imagem: Erika Waleria

“Na verdade, o Coco tem preço. E é caro”


“Nazaré da Mata precisa ser descoberta pela diversidade multicultural, não só do Maracatu Rural, mas do Ciranda Rural e do Coco Rural”. Nesse comentário de Ricco moram duas realidades. A primeira é a de que, mais que conhecer, Pernambuco precisa reconhecer a potência do Coco Rural. E a segunda é o fato de que, no berço de uma cultura tão rica, mora uma gestão municipal que, muitas vezes, não a representa.


Diante desta consequente tentativa de massificar o consumo de cultura, as orquestras de brinquedos populares e os mestres brincantes, donos dos ritmos que são a base do Estado, precisam reivindicar espaço. Tudo isso enquanto lutam pelo reconhecimento do público que é o combustível das brincadeiras que nasceram nos terreiros e nos engenhos.


O que parece inocente em uma expressão como “isso não tem preço”, esconde as dificuldades de quem vive da - e pela - música, e precisa cotidianamente sair em defesa dela como ganha-pão. Nesse sentido, Ricco coloca que “o Coco tem preço e um preço caro”, e reforça que, se não fosse o fomento político e os editais culturais, o meio de sobrevivência de quem transformou a brincadeira popular em profissão dificilmente existiria. 


Desde sábado (30), o público pôde conhecer mais da musicalidade da brincadeira popular que, dessa vez, conta com uma estética distorcida. Ouça o EP  “Coco de Fulô: O Coco Rural” que vai estar disponível em todas as plataformas digitais, e assista ao clipe da faixa “Cana de Santa Fé”, disponibilizado no YouTube.



Para acompanhar mais da cena artística de Nazaré da Mata e saber dos próximos trabalhos do grupo, basta seguir o perfil do grupo no Instagram: @cocodefulo.



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